A relação "problemática" entre José Sócrates e a imprensa nunca foi segredo e muitas vezes pensei, disse e escrevi, que me parecia que a sua atitude e comportamento em relação à liberdade de imprensa não me pareciam os mais correctos e adequados. Mas sinceramente estava convencido, e também o disse e escrevi, que a tese da "asfixia democrática" constituia um manifesto exagero. Obviamente que não tinha razão e por isso devo um pedido de desculpas à Dra. Manuela Ferreira Leite por não a ter levado suficientemente a sério.
Pelo que agora se conhece, o que se passou no "caso TVI" ultrapassa em muito um primeiro-ministro "zangado", irritado ou incomodado com uma parte da comunicação social que lhe era hostil, estamos perante um "chefe maior" que congeminou ou pelo menos participou activamente num "plano" que visaria o controlo de um grupo de meios de comunicação social visando silenciar jornalistas que lhe eram incómodos e que para isso não hesitou em abusar da sua influência em empresas nas quais o Estado está presente.
Perante os factos revelados, o mínimo que se poderia exigir é um inquérito parlamentar que averigue as responsabilidades do primeiro ministro e, caso se confirmem as informações agora avançadas, esperar que os envolvidos retirem as inevitáveis consequências políticas, reconheçam a ausência de condições para o exercício dos cargos públicos que ocupam e se demitam.
Infelizmente, julgo que já conhecemos o suficiente dos envolvidos para saber que não podemos esperar essa dignidade e que se seguirá uma barragem de adjectivos e insultos com que os envolvidos e os "spinners" do costume irão procurar confundir o formal (a quebra do segredo de justiça) e o essencial (os próprios factos), fugir ao assunto através de ataques ad hominem a quem ousar pôr em causa o "chefe maior" e tentar transformar este caso uma questão de conflito partidário entre o PS e a oposição, o que não me surpreendendo lamento particularmente.
E lamento porque, e escrevo isto sem qualquer hipocrisia, custa-me ver um partido (PS) ao qual, como Jorge Lacão ontem bem recordou, Portugal tanto deve a liberdade, antes e depois do 25 de Abril, e que nomeadamente durante o PREC e em particular em Maio de 1975, aquando do caso "Republica", defendeu a liberdade de imprensa em Portugal surgir agora a apoiar incondicionalmente um primeiro-ministro que se envolve nestas "tropelias". É precisamente por essa história e pelo contributo decisivo do PS deu para a construção do Estado democrático pluralista em que felizmente hoje vivemos que se esperaria uma atitude mais exigente do PS e dos seus dirigentes, demarcando-se de comportamentos que são inaceitáveis e que ofendem directamente esses valores.
Mas, sobretudo, lamento porque daí resultará ou um enfranquecimento do PS ou uma chavização / berlusconização do regime. E , em qualquer dos casos, sairá a perder Portugal e a democracia.
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