quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Histórias que dispensam comentários (II)

Augusta Martinho deixou de ser vista e que a última vez que pagou o condomínio foi em Agosto de 2002, há nove anos.

Como a vizinha não aparecia, Aida Martins decidiu participar o seu desaparecimento à GNR. O processo ficou com o registo 2274/2002 e NUIPC 1086/07.2 TQSNT. “Disseram-me que não podiam chegar e abrir a porta”, diz Aida Martins. Que ela saiba, “nada foi feito” para investigar o paradeiro de Augusta Martinho.

Aida Martins resolveu então procurar alguém da família da vizinha. E conseguiu encontrar cinco sobrinhos que não se davam com a tia e um primo, Armando Gaspar de 84 anos. “Acompanhava-a sempre, às compras e ao médico”, diz ao PÚBLICO. E conta que a última vez que a viu foi antes de uma viagem até à Beira Alta onde tem uma casa. “Quando voltei fui lá a casa, fartei-me de tocar mas ela não abriu, nunca mais respondeu”. Resolveu então participar o caso à PSP. O auto de denúncia tem o número 2274/2002. Mas era preciso ordem do tribunal para abrir a porta do apartamento, explicaram-lhe. Por isso, ele resolveu dar notícia do desaparecimento ao tribunal de Sintra, conta. “Fui lá 13 vezes, ainda a semana passada por lá passei. Nunca consegui autorização para arrombar a porta”, afirma.

Também Laurinda Cardoso, vizinha do terceiro frente, estranhando a ausência de Augusta Martinho decidiu participar o seu desaparecimento à Polícia Judiciária. “Ainda cá vieram e telefonaram para cá uma duas vezes, perguntando se a senhora já tinha aparecido, mas mais nada”, diz.

Passaram nove anos. No chão da cozinha. Ninguém se interessou. Ninguém investigou.

Não fossem as Finanças e provavelmente ainda não se saberia. Que o cadáver de Augusta Duarte Martinho jazia há nove anos no chão da cozinha do apartamento em que vivia, na Rinchoa, em Rio de Mouro.

Mas havia uma dívida por liquidar e a ordem de execução de uma penhora.

Eram quase 17 horas de ontem quando uma agente da PSP da 89ª esquadra foi chamada para auxiliar à penhora de um apartamento na Praceta das Amoreiras. A casa já tinha sido vendida em leilão. No local estava, além da polícia, um funcionário das Finanças, a nova proprietária do apartamento que o ía visitar pela primeira vez e um serralheiro com a incumbência de arrombar a porta e colocar uma nova fechadura, procedimento banal neste tipo de situações.

No chão da cozinha do apartamento, encontraram o corpo em avançado estado de decomposição de Augusta Duarte Martinho que, no próximo sábado, completaria 96 anos. Os seus animais de estimação, um cão e dois pássaros estavam também mortos na varanda.

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