quinta-feira, 31 de março de 2011

Escuridão


Na crónica intitulada "Escuridão" no Público de hoje, Pedro Lomba coloca a questão se saber como é que foi possível termos deixado o país chegar à situação crítica em que hoje nos encontramos, atribuindo a culpa ao controlo da informação pelo Governo. Muito sinceramente julgo que não foi esse o (principal) problema, pois não só a informação fundamental sobre a trajectória da nossa economia e a insustentabilidade dos desequilíbrios (fundamentalmente do desequilíbrio externo) e dos problemas das contas públicas estava inteira e facilmente acessível através do INE, do Banco de Portugal, da OCDE, do Eurostat, etc. como essa mesma insustentabilidade era referenciada assinalada pelos (poucos) que se dedicavam a analisá-la.

Não se ter feito nada não resultou de uma conspiração dos políticos, mas do facto de, contrariamente ao que muitos pensarão os políticos, em geral, serem (tal como a população de onde provêm) muito menos informados do que se habitualmente se pensa: um político tende a saber apenas o que precisa de saber, o que muitas vezes não é muito.

Claro que a "culpa" foi também dos economistas, e em especial daquelas instituições (bancos centrais e organizações internacionais) que não tiveram a capacidade suficiente para transmitir (pelo menos com suficiente convicção) a necessidade premente de mudança de rumo. Também não por especial preversidade ou receio, mas julgo que sobretudo por dois factores: i) o facto de se deixarem guiar por modelos teóricos em que se baseiam que assentam na noção de ajustamento ntaural (e gradual) para o equilíbrio e ii) a própria imprevisibilidade da economia, associada ao grau de complexidade dos fenómenos económicos, levava a que fosse impossível saber quando esse ajustamento iria ocorrer e até qual a conjugação de factores que desencadearia a "crise". Pelo que, mesmo os economistas  que "sabiam" que o ajustamento era inevitável não sabiam (nem poderiam saber) com um mínimo de segurança quando (e como) a "crise" iria ocorrer, parafraseando o que alguém disse: "Podemos passar a vida inteira à espera de coisas que sabemos que acontecerão inevitavelmente".

Neste contexto, a tendência natural é para a procrastinação, adiando a ação especialmente quando esta é penosa e impopular e vai afectar negativamente o resultado das eleições.

Ao ler o artigo não pude deixar de tentar colocar-me na posição de um cidadão comum e pensar que se hoje é absolutamente evidente a gravidade da situação, a maioria da população terá provavelmente muita dificuldade em perceber as causas complexas da actual crise e, fundamentalmente, escolher qual a melhor estratégia de saída. Ora, na "escuridão" (incerteza) os seres humanos tendem a ser dominados pelos seus preconceitos e medos, aumentando a imprevisibilidade e a probabilidade de tomar decisões erradas. Estamos pois num momento crítico em que é indispensável, para o nosso futuro colectivo, um debate claro e sereno sobre as razões da crise e a(s) forma(s) de a ultrapassar.

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